São Paulo, 19 de abril de 2024

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06/08/2022

Por que a robótica e a automação não avançam no Brasil?

(07/08/2022) – O cenário de médio e longo prazo da indústria brasileira é uma incógnita. Ao mesmo tempo em que muito se fala sobre a necessidade de modernização, Indústria 4.0, competitividade etc. pouco se vê em termos de políticas, de programas (ou de mudança de cenário) que realmente estimulem a realização dos investimentos necessários para se atingir um novo patamar. De real, o que se tem é a crescente queda de participação da indústria no PIB, ociosidade do parque fabril e, pior, de desindustrialização.

Diante desse quadro, elementos que poderiam contribuir para essa evolução, como a automação e a robótica, caminham a passos lentos no país. Em busca dos motivos desta quase estagnação, o Usinagem-Brasil procurou Edouard Mekhalian, diretor geral da Kuka Roboter do Brasil, que há 38 anos atua no mercado de automação, 28 deles especificamente na área de robótica.

Usinagem-Brasil – Porque a automação e a robótica caminham de forma tão lenta no Brasil?

Edouard Mekhalian – São vários fatores, mas eu diria que, primeiro, historicamente, o planejamento dos investimentos no Brasil sempre contabilizou a mão de obra barata. Esse é um elemento que entra nos cálculos da maior parte dos projetos de investimentos e é um fator que dificulta o avanço e, em alguns casos, é até impeditivo. Em segundo lugar, tem o retorno do investimento, pois, dependendo do processo, o retorno supera 2 anos, porém o cenário econômico que os empresários conseguem visualizar aqui no Brasil não supera seis meses, talvez um ano. Desde o início de minha carreira, há mais de 30 anos, nunca experimentamos um cenário em que o empresário pôde fazer um planejamento de médio e longo prazo consistente.

É um cenário diferente do encontrado em outros países, onde não há mão de obra barata, onde o setor financeiro participa do financiamento da pesquisa e do desenvolvimento e, detalhe importante, onde existe mercado. É este tripé que irá favorecer a realização dos investimentos que tornariam as fábricas mais produtivas, mais competitivas, levando à geração de empregos de melhor nível, com salários melhores e que, portanto, contribuiriam para a formação de um mercado mais robusto.

UB – Como os investimentos em robótica no Brasil estão em comparação com outros países emergentes?

Mekhalian – O consumo de robôs no Brasil sempre foi muito aquém do que deveria ser em termos de tamanho de país. Por exemplo, a Turquia. É um país menor que o nosso, com um mercado menor que o nosso – que temos 210 milhões de habitantes -, mas lá a base instalada é maior e está se vendendo mais robôs do que aqui. No México, o mercado de robótica é o dobro do nosso. Comparativamente, a Argentina tem mais robôs que o Brasil. Nos Estados Unidos, onde está em curso o processo de reshoring e existe falta de mão de obra qualificada, nunca se vendeu tantos robôs como nos últimos dois anos.

UB – No Brasil, muitas empresas também têm alertado para a falta de mão de obra qualificada.

Mekhalian – É verdade. Nossa capacidade de trazer para o mercado mão de obra qualificada, saindo de boas escolas técnicas, também é limitada. E, assim como nos EUA, aqui também em grande parte os jovens não quer mais usar bota e macacão. Nos EUA empresas estão encontrando dificuldade de encontrar mão-de-obra qualificada e estão trazendo de volta profissionais seniores, já aposentados, para que os jovens possam ganhar experiência.

UB– Quais benefícios a automação traria à indústria nacional se o ritmo fosse mais acelerado?

Mekhalian – Teríamos um parque industrial cada vez mais competitivo, mais produtivo e uma indústria mais capacitada a fornecer produtos mais atraentes para o mercado local e para a exportação. Ao tornar as empresas mais competitivas, espera-se que os produtos produzidos sejam mais acessíveis à população. Um estudo da IFR – International Federation of Robotics, de alguns anos atrás, apontou que a robótica tem de trazer este tipo de retorno, pois se vai afetar o chão de fábrica (e o mercado) com demissões é preciso que vendam mais. Ou seja, se terão menos pessoas no chão de fábrica vão precisar de mais gente no primeiro, no segundo, no terceiro andar da empresa. Vão precisar de mais vendedores, compradores, engenheiros, etc. Fazendo isso, a renda será maior. Se a renda é maior, o consumo é maior e isso faz o país se desenvolver como um todo. Isso aconteceu em todos os países analisados. É o caso da Coreia do Sul, que hoje tem mais de 700 robôs para cada 10 mil trabalhadores no chão de fabrica e onde não há desemprego, enquanto aqui temos 14 robôs para cada 10 mil trabalhadores e ainda um grande nível de desemprego.

Mas não adianta pensar que grandes investimentos em automação e robótica irão resolver todos os problemas por si só. É preciso criar as condições econômicas, mercadológicas, para que as indústrias se tornem mais competivas, produtivas, para que tudo possa caminhar junto.

UB – Mas para que isso caminhe junto e que possa ser efetivamente realizado é preciso ter uma orientação vinda de cima que controle e elabore políticas industriais ou uma política de desenvolvimento?

Mekhalian – Sim, deve existir uma politica industrial. Mas não será ela por si só que irá resolver o problema. Temos de ter uma agricultura bem desenvolvida, mas também uma indústria de base bem desenvolvida. Tudo isso junto tem de contribuir para o desenvolvimento do país. Mas aqui é tudo muito setorizado. O agro aqui é extremamente forte, só que extremamente concentrado. É bom ter um agro forte, sim, inclusive é necessário, só que ele tem de contribuir para que todos os outros setores possam se desenvolver. Afinal, para se desenvolver o agro precisa de implementos, máquinas, equipamentos, caminhões, trens. Mas vejo uma dissociação aqui. Se os outros setores se desenvolverem, o agro também vai se beneficiar, basta lembrar que hoje temos mais de 30 milhões de pessoas passando fome – é quase uma Argentina. Em todos os países que conseguiram sair da condição de Terceiro Mundo havia sim uma elite política atuando para que isso acontecesse. Acho que aqui ainda não se chegou a esse nível de maturidade.

UB – Quais incentivos são necessários para impulsionar a automação?

Mekhalian – O primeiro é ter perspectiva de mercado. É fundamental que os empresários possam enxergar que vai haver crescimento de mercado. E isso depende da área econômica. Ajudaria muito se os empresários pudessem olhar para os investimentos em geral. Seja para melhorar a estrutura deles, a área fabril, seja para qualificar a mão de obra. Recentemente comecei a participar de algumas reuniões da Fiesp, que tem buscado ajudar as micro, pequenas e médias indústrias a se modernizar, e o financiamento é uma das principais questões em discussão. É preciso que tenha carência, taxas acessíveis, prazos.

E é preciso que haja pessoal capacitado na área de integração de processos de automação, pois também temos déficit de engenheiros qualificados para esse tipo de trabalho. As escolas melhoraram, antes os alunos saiam com conhecimentos muito básicos, mas hoje já se começa a encontrar pessoas que tiveram contato com robôs nos laboratórios, com CLP’s, computador de processo, que conhecem linguagem de programação, isso ajuda, mas o número ainda é pequeno, precisamos de muito mais.

UB – O Senai, por exemplo, está capacitando profissionais de automação e robótica?

Mekhalian – Sim, está. Talvez não na velocidade que gostaríamos, mas tenho visto muitas iniciativas, principalmente depois do surgimento da Indústria 4.0. As Fatecs também têm investido em robôs, estão se estruturando bem. Várias universidades públicas e privadas também têm investido. Mas uma coisa é ter robô, CLP, etc. e se familiarizar com essa tecnologia. Outra bem diferente é formar um aluno dentro de uma escola já com capacidade imaginativa na área de integração de soluções. É preciso haver um elo maior entre as entidades de ensino com a indústria, como existe na Alemanha com o Instituto Fraunhofer, que é uma espécie de grande incubadora onde se encontram alunos, professores, pesquisadores, trabalhando em conjunto nas demandas da indústria. Sinto falta deste ambiente intermediário, interligando área acadêmica e indústria. É nesse ambiente que se criam os jovens que já entram numa empresa de automação, de engenharia, capacitados, sabendo o que é um sistema de visão, como tem de ser o sistema de iluminação, o tipo de garra e os opcionais que irá usar, qual o modelo de robô, etc, etc …

UB – Quais benefícios esse ambiente intermediário poderia oferecer às pequenas e médias indústrias?

Mekhalian – A maioria das empresas, e as PMIs são mais de 80% das indústrias no Brasil, não tem corpo de engenharia para atender suas necessidades e, em muitos casos, os preços praticados pelos integradores está acima das possibilidades dessas empresas. Se elas tivessem acesso a, por exemplo, um Senai amplo e especializado em automação de processos de manufatura de forma mais longínqua em nosso grande território, isso as ajudaria a desenvolver as soluções que precisam para implantar nas suas fábricas. Ou seja, ainda existem lacunas. Essas empresas precisam ter acesso a um ambiente em escolas técnicas, não só de engenharia, que fizesse esse intercâmbio para que adquiram conhecimento e possam criar um corpo técnico próprio e depois seguir com as próprias pernas. Para dar essa alavancagem falta preencher essa lacuna de alguma maneira. Isso tem de ser feito e ser bem divulgado para que as empresas acreditem realmente que indo naquele lugar irão encontrar as soluções que necessitam. E é justamente nesse caminho que a Fiesp está se mobilizando no estado de São Paulo.

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