(*) Marcelo Acacio de Luca Rodrigues
(04/08/2019) – É com imenso orgulho e sentimento de desafio que inauguramos a coluna CLÁSSICOS DA USINAGEM no site Usinagem-Brasil. Esta coluna semanal apresentará resenhas de textos clássicos sobre manufatura por usinagem, de fontes variadas, como livros e outros textos científicos, que merecem respeito nos diferentes ambientes que envolvem os processos de usinagem, desde o chão de fábrica que diariamente faz cavaco até os setores de planejamento e projeto das indústrias de manufatura, passando inevitavelmente pelos diferentes níveis acadêmicos. Enfim, são textos que merecem ser lido e relidos, pois uma grande parte dos problemas atuais no dia a dia da usinagem já foram de alguma forma discutidos no passado e a solução de problemas atuais pode passar pelo mesmo pensamento que os antigos já enfrentaram.
Nada mais justo que iniciar esta jornada com a apresentação de uma resenha da primeira parte do livro ON THE ART OF CUTTING METALS, escrito ao longo da vida de pesquisador daquele que pode ser considerado como um dos fundadores do pensamento científico na indústria, o próprio Frederick Winslow Taylor, conhecido somente por Taylor. Este mesmo texto também foi publicado em forma de artigo científico em um famoso periódico internacional. Entretanto o livro completo, que leva o mesmo nome, será apresentado em diversas resenhas, e esta é apenas a resenha da parte 1.
Uma vez que Taylor dispensa comentários sobre o conjunto de sua obra, o texto específico ON THE ART OF CUTTING METALS pode ser entendido como uma espécie de resumo, verdadeiramente um diário sobre uma de suas linhas de pesquisa (em termos atuais da academia), visto que Taylor é famoso por consolidar um pensamento científico na administração da produção e, com certeza, as empresas de manufatura em que Taylor atuou foram plantas industriais de usinagem, fundição e forjamento. Para situar o leitor, o texto de Taylor tem sua publicação final completa em 1906, época em que não havia plásticos ou outros processos que não utilizassem invariavelmente metais para serem usinados.
Um ponto importante sobre ler o texto original do Taylor (que pode ser acessado em domínio publicado na internet), é perceber o estilo tipo “diário de conclusões” com que a primeira parte do texto foi escrito. Ao longo das 29 páginas iniciais, que encerram a primeira parte, Taylor apresenta diversos conceitos que não estão separados por tópicos. Isto é interessante pelo fato de que um texto científico muito longo, sem divisão em itens ou capítulos, tem muita chance de “perder sentido”. Entretanto, o texto de Taylor é coeso e interessante de ler, mesmo com a mudança súbita de assuntos entre um parágrafo ou outro.
A parte 1 do texto tem apenas 29 páginas e 129 parágrafos (numerados), forma de redação que remete ao “diário de conclusões”. Mas a parte 2, apesar de dividida em itens, mantém o mesmo estilo de escrita, com parágrafos numerados que permitem uma leitura com pausas entre os parágrafos, pois os mesmos mudam de assunto, mas sempre sobre o mesmo tema do contexto. Na parte 2, há uma preocupação com a divisão do texto em itens e tópicos, principalmente pela quantidade de páginas (209, incluindo o índice da parte 2).
Já no começo da obra, com grafia diferenciada para trazer o devido destaque ao texto, Taylor define até o quinto parágrafo o problema da usinagem e qual é o principal propósito do texto. A figura a seguir é descrição de Taylor para o problema diário da usinagem nas oficinas:
(Que traduzido será):
A – Qual ferramenta devo utilizar?
B – Qual velocidade de corte devo utilizar?
C – Qual avanço devo utilizar?
Uma imediata reflexão pode ser feita por qualquer profissional da usinagem, sobre o caráter atemporal destas perguntas, pois, de 1906 até hoje, as perguntas são as mesmas. É claro que com soluções e possibilidades distintas atualmente, mas as perguntas são exatamente as mesmas…
Ainda no início da parte 1, Taylor particulariza suas conclusões no texto para operações que o próprio autor denomina “desbaste”, mas sem desconsiderar a importância das operações que ele mesmo denomina “mais leves”. Taylor busca solucionar o problema das três questões da figura 1 com a construção de uma espécie de “régua de cálculo”, uma espécie de gráfico que auxilie os operadores na realização de suas tarefas particulares de planejamento e execução do processo de usinagem em cada situação do dia a dia da manufatura.
Para concluir a importância da ideia de formar um “gráfico” ou “régua de cálculo”, Taylor deixa claro que considera o técnico mais bem treinado aquele que utiliza esta “ajuda” científica do que aquele que somente se apoia em experiência. Taylor não despreza a experiência, mas considera que esta pode ser melhorada com o estudo científico.
No parágrafo 11, Taylor esclarece que existem 12 variáveis que atuam conjuntamente, resultando na base das relações que formarão a “régua de cálculo” na prática da usinagem. Estas variáveis são:

Taylor na continuidade do texto busca encontrar relações exclusivas e mútuas entre estas variáveis e a velocidade de corte. E, como pode ser percebido pelo leitor, nem todas as doze variáveis se relacionam com a velocidade de corte diretamente.
Desta forma, o trabalho científico desenvolvido se dividiu em 4 etapas sugeridas por Taylor como sendo:
A – Determinar com base em experimentos e nos principais fatos científicos as possíveis leis relacionadas à arte de cortar metais;
B – Encontrar relações matemáticas que tornem a explicação dos fatos e leis simples para o uso diário;
C – Conhecer limitações e possibilidades das máquinas operatrizes;
D – Desenvolver uma régua de cálculo que incorpore as relações matemáticas que descrevem as leis.
No parágrafo 17, Taylor descreve uma experiência de sucesso em aumentar a produtividade com base em experimentos científicos, quando comparado com o conhecimento pré-existente, baseado somente em experiência. Entretanto, ele salienta que este sucesso só foi possível devido ao gerenciamento baseado no pensamento científico que os até então empresários industriais, das empresas onde estes ensaios foram realizados, acreditavam. Taylor desenvolveu seu texto com base em experimentos em chão de fábrica, e encontra-se pouquíssimo em seu texto sobre experimentos realizados em laboratórios de pesquisa.
A principal característica observada por Taylor em seus ensaios nas diferentes indústrias sempre foi a velocidade de corte. Um detalhe importante é que estes resultados se estenderam por anos de análise de uma equipe, e nunca um resultado particular de um pesquisador ou outro. Naquela equipe de pesquisadores cada membro possuía habilidades particulares destacadas: metalurgistas, gerenciadores, matemáticos e integradores de soluções, como é o caso do próprio Taylor.
Diversas empresas participaram dessas investigações realizadas ao longo dos 26 anos. E nenhum nome em particular merece destaque, com exceção da Midvale Steel Company, onde o trabalho começou.
Ainda dentro do rigor da pesquisa científica no chão de fábrica no qual diversas pessoas entram em contato com o estudo realizado, Taylor deixa claro que nenhum conhecimento foi vendido, mas o pagamento pela investigação sempre aconteceu. As empresas se beneficiaram dos resultados inevitavelmente. O sigilo sempre foi mantido sobre os resultados investigados.
(*) Marcelo Acacio de Luca Rodrigues é engenheiro mecânico, doutor em engenharia mecânica, licenciado em filosofia, microempresario e professor universitário.
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